Frases

"[...]“Wanya” é um verdadeiro espectáculo visual e a prova cabal do grande talento de um desenhador, Nelson Dias, que infelizmente não deixou muita obra neste campo"
João Miguel Lameiras



segunda-feira, 7 de janeiro de 2008

WANYA - ESCALA EM ORONGO – UMA TOMADA DE POSIÇÃO NO CONTEXTO CULTURAL PORTUGUÊS

Nelson Dias - fotografia de Augusto Mota

WANYA - ESCALA EM ORONGO – UMA TOMADA DE POSIÇÃO NO CONTEXTO CULTURAL PORTUGUÊS

Um acontecimento de relevante importância ocorreu recentemente na Livraria Opinião com o lançamento de um álbum de banda desenhada que se afasta deliberadamente de tudo aquilo que se fez até hoje em Portugal: Wanya – Escala em Orongo.

Os seus autores, Augusto Mota e Nelson Dias, concederam-nos alguns momentos de atenção, durante os quais procurámos avaliar as suas intenções, detectando o que representa para ambos a linguagem da banda desenhada.

Vasco Granja – Diga-me, Augusto Mota, que significa a vossa criação de “Wanya – Escala em Orongo”?

Augusto Mota – Parece-me ser necessário referir, em primeiro lugar, a necessidade de produzir banda desenhada, encarando este facto como uma experiência importante para nós.

É também uma experiência importante editar uma obra como “Wanya - Escala em Orongo”. É também uma enorme responsabilidade para o editor, pois, como se sabe, verifica-se uma certa relutância no nosso meio em editar banda desenhada como uma forma de arte.

V.G – É portanto uma experiência inédita para vocês.

A.M. – Eu até preferia chamar-lhe, em vez de banda desenhada, um outro nome, por exemplo, narração figurativa, pois de “Wanya – Escala em Orongo” sai um pouco fora do âmbito normal dos quadradinhos na medida em que o grafismo é diferente, concedendo um lugar destacado a uma visão subjectiva, e o texto é utilizado com uma força distinta do habitual, sublinhando determinados aspectos do desenho. Com esta obra, e sem pretender intelectualizar a narração figurativa, tentámos que ela fique enquadrada, no contacto português, dentro do plano de criação cultural positiva.

Por entendermos que muitos dos intelectuais portugueses se afastam de tudo o que seja a narração por imagens, decidimos mostrar que esta deficiência de natureza estética não tem justificação.

“Wanya – Escala em Orongo”, significa portanto uma tomada de posição em relação a certos preconceitos mantidos por uma geração que não aceita a originalidade da narração figurativa.

A IMPORTÂNCIA DA IMAGEM


V.G. – Encara a narração figurativa como uma forma de arte?

A.M. – Sim. Tudo o que é imagem tem um significado muito especial no mundo de hoje. Permito-me destacar a importância da narração figurativa onde a imagem representa uma função diferente daquela que desempenha no cinema ou na televisão, cujo carácter fugitivo não permite o espectador apreender os seus pormenores. Claro, trata-se de linguagens distintas, cada uma delas com os seus próprios princípios.

V.G. – A narração figurativa para si é o meio ideal de comunicação?

A.M. – Para mim, representa alguma coisa mais do que aquilo que nos permite a palavra.

V.G. – Como nasceu “Wanya – Escala em Orongo”?

A. M. – O trabalho inicial deve-se a Nelson Dias, que começou a criar desenhos sem qualquer texto. Executou seis pranchas, mostrou-mas e solicitou a minha colaboração como argumentista.

UMA EXPERIÊNCIA QUE RESULTOU

V.G. - É melhor perguntar a Nelson Dias como a história se desenvolveu…

Nelson Dias – Tudo começou por eu sentir uma irresistível necessidade de desenhar. Sou pintor por formação e toda a minha vida tem sido dedicada à pintura. Mas em certo momento, numa época em que as condições de trabalho não eram muito favoráveis, por não dispor de um estúdio para pintar, decidi começar a desenhar segundo uma óptica particular que é a narração figurativa.

A banda desenhada exige uma disciplina muito peculiar. Inventei uma personagem, sem pensar em qualquer base narrativa, pois nunca pensei que as experiências então feitas levassem à concepção de uma história. Estava convencido de que não passava de uma experiência, da qual acabaria por desistir devido a diversos factores.

Quando cheguei a acumular seis pranchas mostrei o trabalho ao Mota que se entusiasmou e comprometeu-se a elaborar um texto, obrigando-me a prosseguir o que estava feito.


A BANDA DESENHADA É POSSÍVEL EM PORTUGAL

V.G. – Como vê o aproveitamento deste álbum no panorama geral da cultura portuguesa?

N.D. – A nossa preocupação é mostrar que se pode fazer banda desenhada em Portugal. Com conteúdo filosófico tão empenhado como o que estamos habituados a ver na produção estrangeira. Como não há revistas onde os originais portugueses possam ser publicados, a solução que nos pareceu melhor foi a edição do álbum, o que nos permitiu uma maior liberdade de concepção gráfica. A este respeito posso dizer que “Wanya – Escala em Orongo” não teve qualquer imperativo comercial a limitar o nosso esforço criativo

Entrevista com Vasco Granja

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